domingo, 14 de setembro de 2008

Produção de texto

Elege-se um tema, e, em seguida, sugerem-se os procedimentos que devem ser adotados para uma elaboração de um plano de redação. Em termos práticos, a partir de um tempo proposto, o que se deve fazer? Como fazer? Apresentam-se aqui sugestões, que podem ser analisadas e adaptadas ao desenvolvimento de outros temas e um dos roteiros possíveis para desenvolver um tema.


Antes de iniciar uma redação convém avaliar as seguintes sugestões para produzir um bom texto:

  • a) transcrever o tema, sem subtítulos;
  • b) nunca iniciar um texto com as mesmas palavras do título;
  • c) fazer um levantamento do contexto;
  • d) analisar as ideias;
  • e) repassar tudo o que se pretende escrever;
  • f) determinar a ordem das ideias (iniciar com a mais importante ou com a menos importante);
  • g) empregar frases e períodos curtos;
  • h) evitar repetições de palavras, empregando sinônimos ou pronomes adequados;
  • i) não usar rimas na prosa;
  • j) estabelecer relações lógicas entre os períodos, usando os conectivos adequados;
  • k) não começar período com gerúndio (ou formas nominais do verbo);
  • l) tratar o assunto com precisão e concisão, sem extrapolações.

Parece também muito útil saber como um professor avalia uma redação, quais os elementos que “pesam” mais na correção. Um texto é julgado pelos seus aspectos básicos: estrutura, conteúdo e expressão. Na estrutura avalia-se a unidade do tratamento do assunto, sem extrapolações; a organização das partes (introdução, desenvolvimento e conclusão) e a forma (verso/prosa/descrição/narração/dissertação), que inclui a coerência e coesão. No conteúdo, examina-se a lógica da linha de raciocínio, o encadeamento e a clareza das ideias. Na expressão avalia-se a originalidade do enfoque, das ideias apresentadas; a adequação da expressão ao conteúdo; a concisão e a correção gramatical. Neste último item, note-se que acentuação e ortografia são aspectos de menos importância. A estrutura das frases, a prioridade do emprego dos vocábulos é muito mais importante.

Estrutura: Unidade / Organização / Forma

Conteúdo: Coerência / Clareza

Expressão: Originalidade / Adequação / Concisão / Correção

Um Estilo Centenário

Autor de nove romances, quatro livros de poesia, sete contos, 10 peças de teatro, além de críticas, traduções e crônicas, Machado de Assis foi o crítico da sociedade fútil, da falsidade dissimulada, da retórica vazia, mas era consciente de que é impossível fazer o relato completo da realidade, pois o sentido das coisas não é estável, mas escorreito; não é sólido, mas gelatinoso.
Sinal de seu encanto contínuo, já se falou tanto de Machado que até as interpretações consagradas sobre sua obra conquistaram o benefício da dúvida; ou, pelo menos, da relativização. Há quem ache agora um mito a ideia de um autor de duas faces (o romântico até ingênuo que guina a carreira na maturidade, com Memórias Póstumas de Brás Cubas), em favor da apreensão orgânica de seus livros, fruto que seria de uma mesma sintonia intelectual. Há quem ache irrelevante o “enigma de Capitu”, de ser ela ou não a traidora, que o projeto de Dom Casmurro não é só a incerteza sobre a mulher de Bentinho ou sobre o narrador Bentinho, mas sobre a própria condição do narrador.
Para muitos, Machado teria desenvolvido sua escrita dentro de um marco de ironia estilística, a que José Guilherme Merquior deu fama numa conferência (Machado em perspectiva), na Faculdade de Letras de UFRJ, em 1989. Merquior chama a atenção para a originalidade de Enylton de Sá Rego, o primeiro a vincular Machado à tradição menipeia.
A sátira menipeia traz uma situação fantasiosa, mas seu registro se dá no ponderado, no distanciamento e nos elementos de realismo que tornariam uma situação plausível. Memórias Póstumas de Brás Cubas é a encarnação mais explicita dessa tradição. Cantar a tragédia com gravidade seria jogar no mesmo terreno da melancolia, do mundo de certezas opacas e unívocas. Mas parodiar a morte é rir da própria autopiedade. E Machado o fez embaralhando os gêneros, abusando da ironia e explorando o absurdo quando parecia usar técnicas realistas. Seu humor é gráfico, brinca com associações de ideias, desenha na imaginação do leitor, não vem da piada explicita. Daí seu esmero retórico.

Retórica Machadiana
Como Machado usava sua hoje reverenciada sutileza? A favor de um olhar compreensivo das fraquezas humanas. No conto Um Homem Célebre (Várias Histórias), o pianista Pestana sonha com a imortalidade que nunca terá, a mesma das criações de Beethoven ou Mozart. Tomara gosto pela música na infância com um padre, que as más línguas garantiam ser seu pai biólogo. Mas, engolido pelo horizonte limitado de seu tempo, Pestana ganha fama como compositor de polcas. Esse é o conflito nuclear da narrativa; por isso, Machado logo explorar a filiação de Pestana.
“Compusera alguns motetes o padre, era doudo por música, sacra ou profana, cujo gosto incutiu no moço, ou também lhe transmitiu no sangue, se é que tinham razão as bocas vadias, cousa de que se não ocupa a minha história, como ides ver.”
Em seguida, o narrador centra-se no principal: o cotidiano de um músico de ambições clássicas que, popular mas vencido pelas ambições de ocasião, morre sem compor nada de erudito (“bem com os homens, mal consigo mesmo”).
Até ali o assunto da paternidade de Pestana esteve encerrado, mas Machado, de relance, deixou lá pela metade do conto sua marca. Enquanto narra o pianista num momento entusiasmado da composição de uma polca, menciona de passagem:
“Gosto dela; na composição recente e inédita circulava o sangue da paternidade e da evocação”.
E nos dá, discretamente, com piscadela, a confirmação dos boatos maldosos, que, na superfície, garantira evitar.


Elegância Retórica
Comportamentos insólitos são disfarçados em cenários a que estamos familiarizados. Machado incorporou alusões que dão, à superfície das situações que descrevia, a força de comentário crítico. Seu narrador é irônico, está em permanente dialogo com o leitor. Seu texto quer cumplicidade, busca mudar o gosto de um público que não era, em seu tempo, dos mais experimentados.
O processo de forjar o leitor crítico implicou para Machado chamar a atenção para o funcionamento de seu próprio texto. Em Memórias Póstumas ele consegue até fazer transições narrativas manipulando uma digressão (sobre o método).
“E vejam agora com que destreza, com que fina arte faço eu a maior transição deste livro. Vejam: o meu delírio como meu grão-pescado da juventude; não há nascimento sem meninice; meninice supõe nascimento; e eis aqui como chegamos nós, sem esforço, ao dia 20 de Outubro de 1085, em que nasci. Viram? Nenhuma juntura aparente, nada que divirta a atenção pausada do leitor: nada. De modo que o livro fica assim com todas as vantagens do método, sem a rigidez do método. Na verdade, era tempo. Que isto de método, sendo, como é, uma coisa indispensável, todavia é melhor tê-lo sem gravata nem suspensórios, mas um pouco à fresca e à solta, como quem não se lhe dá da vizinha fronteira, nem do inspetor do quarteirão.”
O mundo é tecido complexo, de poucas, falsas ou meias verdades. Na crônica O Punhal de Martinha, publicada no jornal A Semana (1894), esse limite é explicado:
“Não quero mal às ficções, amo-as, acredito nelas, acho-as preferíveis à realidade; nem por isso deixo de filosofar sobre o destino das coisas tangíveis em comparação com as imagináveis. Grande sabedoria é inventar um pássaro sem asas, descrevê-lo, fazê-lo ver a todos, e acabar acreditando que não há pássaros com asas”.
A realidade de um pássaro sem asas é uma metáfora machadiana típica. A vida não cabe na arte. A dimensão do discurso cria a realidade própria, que então dita os nossos passos. Discurso, convenção social, arte, política, qualquer signo, enfim, cria o próprio objeto e ele se reitera no tempo, se amplifica no espaço, vira tradição, impõe comportamentos como se fossem a própria realidade material do mundo.
O mundo exterior à linguagem, parece dizer Machado, pesa menos que os efeitos de real provocados pelo imaginário humano. O pássaro sem asas é uma imagem irônica da convenção do mundo em discurso, única maneira de realmente representá-lo. Machado reflete sobre a cultura, não a natureza. Descrê de que há essências, vê o mundo como uma construção. E faz isso como quem pisca de lado.

Edição de texto originalmente publicado em Língua Portuguesa 29, abril de 2008

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Uso do Circunflexo

QUE ou QUÊ?
A palavra quê só tem acento circunflexo quando está substantivada ou no fim da frase: “Ela possuía um quê todo especial.” (= substantivo) “Procurava não sabia o quê.” “Ele viajou por quê?”
TEM, TÊM ou TEEM?
“Ele tem” = 3ª pessoa do singular do verbo ter (presente do indicativo); “Eles têm” = 3ª pessoa do plural; “teem” não existe.
VEM, VÊM ou VEEM?
“Ele vem” = 3ª pessoa do singular do verbo vir (presente do indicativo); “Eles vêm” = 3ª pessoa do plural do verbo vir (presente do indicativo); “Eles veem” = 3ª pessoa do plural do verbo ver (presente do indicativo).

Fonte: SILVA, Sérgio N. D. da, O português do dia-a-dia: como falar e escrever melhor. Rio de Janeiro: Rocco, 2004

Uso dos Porquês

1º: PORQUE
é conjunção causal ou explicativa: “Ele não foi porque estava doente.” “Ele deve estar em casa porque a luz está acesa.”

2º: PORQUÊ
é a forma substantivada (= antecedida de artigo “o” ou “um”): “Quero saber o porquê da sua decisão.” “A professora quer um porquê para tudo isso.”

3º: POR QUÊ
só no fim de frase: “Parou por quê?” “Se ele mentiu, eu queria saber por quê.” “Eu não sei por quê, mas a verdade é que eles se separaram.”

4º: POR QUE
  • em frases interrogativas diretas ou indiretas: “Por que você não foi?” (pergunta direta). “Gostaria de saber por que você não foi.” (pergunta indireta).
  • quando for substituível por POR QUAL, PELO QUAL, PELA QUAL, PELOS QUAIS, PELAS QUAIS: “Só eu sei as esquinas por que passei.” (= pelas quais). “É um drama por que muitos estão passando.” (= pelo qual). “Desconheço as razões por que ela não veio.” (= pelas quais).
  • quando houver a palavra MOTIVO antes, depois ou subentendida: “Desconheço os motivos por que a viagem foi adiada.” (= pelos quais). “Não sei por que motivo ele não veio.” (= por qual). “Não sei por que ele não veio.” (= por que motivo – por qual motivo).

Fonte: SILVA, Sérgio N. D. da, O português do dia-a-dia: como falar e escrever melhor. Rio de Janeiro: Rocco, 2004